quinta-feira, março 15, 2007

Os jovens desinteressam-se, parece, por todas as artes, excepto pelo cinema. É uma arte directa - funcionalismo da imagem nos tempos de hoje. Arte rápida - velocidade de hoje. Recuperação do erotismo, mais flagrantemente imiscuído ao cinema - problema de libertação, de contestação. E insinuadamente, o cinema traz consigo uma espécie de mística no silêncio e escuridão envolventes das salas de espectáculo. Além de que ele é a arte mais jovem de todas - mais próxima no tempo e logo mais próxima da sedução da juventude. Uma questão intrigante é essa - a paixão de hoje pelo efémero. Não apenas porque neste caso um filme dura talvez pouco e é assim difícil aguentá-lo, se tem alguns anos em cima. Não apenas por isso mas ainda porque só o podemos ver enquanto em exibição. Não assim um livro, quadro , reprodução, música (disco), de que dispomos quando nos apetece. E porque envelhece mais depressa um filme do que um quadro, uma música ou um livro? Um filme de há dez anos é intolerável. Mesmo os bons filmes. Têm a sua pressa em envelhecer. Creio que pela razão de os seus meios de surpresa serem bem definidos, sem o halo da sugestão onde podemos instalar-nos em sucessivas repetições. Um filme é sempre muito concreto, como imagem do concreto. Num quadro, mesmo num quadro, a sua própria imobilidade é já um meio de comtemplação. Além da cor, da linha, da composição que há tempo de ir vendo. Um filme não se «contempla»: vê-se.
13 de Fevereiro de 1969
Vergílio Ferreira - Contra-Corrente

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