terça-feira, novembro 18, 2008

Leituras

"Tirou uma camisola da mala e enfiou-a pela cabeça. Por um minuto, viu só a escuridão da lã e, depois da cabeça lhe sair pelo decote, reparou que estava a ser contemplada. Corou: fazia parte da intimidade do casamento que aquelas pequenas coisas fossem observadas - vestir-se e despir-se, olhar-se ao espelho, fazer gestos inconscientes... o fim da intimidade pessoal.
(...)
Ela olhou-o. Uma das coisas mais surpreendentes em tudo aquilo era a pura alteridade, pensou. ele é outra pessoa: não sou eu. E há um pedacinho dele, do que faz dele aquilo que é, que nunca conhecerei, nunca alcançarei. Algo para o qual não tenho uma palavra. A alma? Não. Bom, talvez. Isso, seja lá o que for, nunca será meu. E se lhe pedisse que me contasse qualquer segredo?, nenhum em especial, só um que nunca tivesse contado a ninguém, nunca. Todos nós temos um, pelo menos. Pelo menos, um segredo. Sorriu àquele pensamento. E que lhe contaria, se lhe pedisse o mesmo? O que tinha feito ou pensado: o que gostaria de fazer ou pensar, se se permitisse tal coisa?"

in Angus de Alexander McCall Smith (Teorema - Colecção Mitos)

Sem comentários: